Campanha da Fraternidade 2011 aborda o tema Ecologia

28/02/2011 11:09

 

A igreja está lançando a campanha da fraternidade 2001 com o tema “fraternidade e a vida no planeta” e o lema “a criação geme em dores de parto”. Como você vê a atual situação da vida no planeta?

 Há muita gente chamando a atenção para a situação em que a Mãe Terra se encontra com a ação do homem sobre os ecossistemas do mundo. Há muita gente também dizendo que há exageros e fanatismo em torno dos temas ambientais. Entre as razões científicas e ideológicas podemos afirmar que as mudanças climáticas são visíveis a olho nu. Negar é omissão gravíssima.

O sistema econômico, político, cultural, social e ambiental que predomina no mundo hoje é baseado em teorias capitalistas que na prática buscam o lucro a qualquer custo baseado numa falsa liberdade individual de escolha e que o consumo de bens pouco duráveis e com extrema beleza se transformou na forma mais ampla de status social: quanto mais consumo, mais sou aceito socialmente. A compra da satisfação física e material passa a ser o fim da vida e o egoísmo (eu primeiro, depois eu e, em seguida os demais) é a face viva deste modo de pensar (Frei Beto).

           O consumo estimulado se transformou em consumo compulsivo hoje tratado como doença chamada oneomania. O consumo é tanto que “as pessoas usam dinheiro que não têm, para comprar coisas que não necessitam, para impressionar pessoas que não conhecem.” (Oystein Dahle). Nenhuma sociedade produziu tantos resíduos como a nossa (Pablo Neruda). A maior prova de que o ser humano não sabe usar os recursos materiais e intelectuais que tem é o lixo.

           A vida no planeta está ameaçada e muitos seres vivos desapareceram, muitos estão em extinção e muitos desaparecerão nos próximos anos. O desaparecimento de espécies compromete a vida de outras e assim sucessivamente até que virá o fim e o recomeço como a Mãe Terra fez durante a formação do planeta Terra.

            A degradação da vida humana também faz parte deste panorama. Estamos expondo populações inteiras a agentes químicos extremamente venenosos, com efeitos cumulativos, que começa antes do nascimento, sem saber quais os resultados deste “experimento”, sem nenhum paralelo anterior para nos guiar (Rachel Carson).

            Estamos vivendo esta crise de civilização pelo descuido com a vida das pessoas, dos animais, dos vegetais, do solo, do ar, da alimentação, da saúde, da educação, do planeta. É urgente uma nova ética baseada no cuidado (Leonardo Boff). Muitas civilizações ao longo da história desapareceram por não cuidarem de aspectos materiais, religiosos, intelectuais, ou naturais que eram essenciais para sua continuidade.

Precisamos entender que a vida plena e feliz que precisamos e desejamos pressupõe cultura, lazer, ócio, trabalho, religiosidade, alimentação, jejum, auto-estima, companhia, amar e ser amado, convivência, respeito entre gerações, valorização do ser, satisfação das necessidades biológicas, de proteção, de abrigo, de afeto.

 

Qual a visão que a ecologia e economia deveria nos orientar hoje?

A sociedade sustentável é aquela que é capaz de satisfazer suas verdadeiras necessidades sem comprometer as chances de sobrevivência das gerações futuras (Lester Brown). A terra também pertence aos que ainda estão por nascer.

A ecologia (estudo da casa) é uma ciência, que estuda as relações entre os seres vivos (também o homem) e o meio ambiente (Haeckel, 1866), enquanto a economia (gerir, administrar a casa) é uma ciência que estuda a atividade econômica, a maneira que os homens empregam os recursos para satisfazer os desejos e necessidades humanas.

            Para gerir uma casa é preciso conhecê-la. Imaginemos como seria a gestão de uma casa se colocamos uma pessoa que não conhece a casa, não aceita opiniões de quem conhece e faz tudo sem conhecê-la. Assim está o homem sendo economista e gerindo a casa sem conhecê-la plenamente. A própria economia por si só pressupõe economizar e não gastar desenfreadamente.

            A ecologia deve nos orientar para o necessário e o útil para a vida biológica, material, mental e espiritual. Mahatma Gandhi já disse que “a Terra tem o suficiente para as necessidades de todos, mas não para a ambição de todos”.

            A sobrevivência da humanidade vai depender de nossa habilidade em entender os princípios da ecologia e viver de acordo com eles (Fritjof Capra). Temos sabedoria suficiente para reconstruir no planeta terra o habitat para todos os seres vivos.

            O esforço de milhões de pessoas em produzir de maneira ecológica e sustentável, o esforço de milhões de pessoas para refletir e educar para o bem estar e a preservação ambiental, o esforço de milhões de pessoas em se organizar e defender seus direitos é sinal forte de que no meio da humanidade estonteada e fascinada com o “moderno” existe a possibilidades de um novo paradigma de civilização: a Ecogenese que deverá substituir a Antropogenese. A criação geme em dores de parto, eis o momento que vive a humanidade.

            É Urgente a educação ambiental com visão holística para despertar de dentro para fora (e-ducere) o cuidado e a sabedoria da observação e compreensão das conexões visíveis e ocultas entre todos os seres vivos.

 

Qual o papel da igreja nesse tema? O que a campanha da fraternidade 2011 pode nos propor?

            A re-ligação (religião) entre o ser humano e a natureza é o grande desafio para a reflexão-ação do tema da campanha da fraternidade “Fraternidade e a vida no planeta” e o lema “A criação geme em dores de parto”. A semente só dará fruto se morrer (transformar). A aparente agonia da morte é o passo para o parto de um novo paradigma.

            Em Mateus 7, 24 e 25 Jesus afirma que “quem ouve estas minhas palavras e as pões em prática, é como o homem prudente que construiu sua casa sobre a rocha. Caiu a chuva, vieram as enxurradas, os ventos sopraram com força contra a casa, mas a casa não caiu, porque foi construída sobre a rocha”.

            A campanha deve estimular a percepção de que é o cuidado que permite a revolução (recuar para evoluir), ao priorizar o social sobre o individual, o coletivo sobre o particular, o ambiental sobre o economico e orientar o desenvolvimento para a vida plena dos humanos e de todos os seres vivos. O cuidado faz surgir o ser humano complexo, sensível, solidário, cordial, conectado com tudo e com todos no universo. (Leonardo Boff). A dimensão ecológica das escrituras sagradas deve ser aprofundada.

Nossos problemas de hoje vem de nossas soluções de ontem (Peter Senge). Portanto as soluções de hoje serão ou não os problemas de amanhã. Já dizia um velho provérbio chinês que “podemos escolher o que semear, mas somos obrigados a colher aquilo que plantamos.”  

            Precisamos usar nossa capacidade de escolha para usar com responsabilidade os recursos intelectuais e materiais que dispomos e recuperar o que foi destruído. (Leonardo Boff). O que distingue ser humano dos outros animais é a nossa capacidade de produzir alterações “inteligentes”. Precisamos criar um novo sentido ético e moral que propicie uma nova razão instrumental, emocional, espiritual que transforme a ciência, a tecnologia e a crítica em medicinas para a cura da Terra e da humanidade.

            O cuidado é como a semente de erva-mate. Para nascer é preciso quebrar a dormência. Quebra de dormência precisa de calor. Tomara que seja o sentimento/calor humano que desperte o cuidado. Que não seja o calor do aquecimento global que quebre a dormência do cuidado. Amém.

 

Gilso Giombelli

Agricultor cooperativista e permacultor

Seara/SC

 

Fonte: Jornal Diocesano, março de 2011